Reproduzo aqui uma série de tweets publicados por Rodrigo da Silva @rodrigosdasilva. O link para a sequência de tweets publicados originalmente em 28/12/20 no Twitter podem ser seguidos através deste link a seguir:
https://twitter.com/rodrigodasilva/status/1343665958578249728
Os tweets são muito interessantes porque dão uma amostra do que é o regime comunista chinês e de como é contraditório que o movimento progressista ocidental, principalmente aqui no Brasil, mostre simpatias pelo regime totalitário chinês. Os tweets revelam comportamentos e atitudes consideradas intoleráveis no Ocidente.
Aproveitando o momento, é interessante esclarecer que progressistas é um termo muito amplo que abrange comunistas, socialistas, social-democratas, a maior parte da grande mídia e esquerdistas em geral. A esquerda está sempre atualizando seus termos, de forma que se mostre mais atrativa ao público e capture a atenção das pessoas, principalmente dos jovens imaturos e assim, garanta a renovação de seus quadros.
1-Poucas coisas me impressionam mais do que ver a defesa do governo chinês por progressistas ocidentais. Nenhuma nação tão influente no mundo rejeita com tamanha veemência os valores progressistas e persegue tão abertamente minorias quanto a China. Quer ver só?
2-É LGBT? Má notícia. O casamento gay e a adoção de crianças por casais LGBTs não são permitidos na China. Imagens de homens usando brinco podem ser borradas na tv pela censura como parte de uma agenda para reforçar as noções tradicionais de masculinidade.
3-A China proíbe representações LGBTs na tv como parte de uma repressão a “conteúdo vulgar, imoral e prejudicial à saúde”, comparável à “perversão sexual, agressão sexual, abuso sexual, violência sexual e assim por diante” (as aspas são do governo).
4-É mulher? A mera organização de protestos feministas pode levar à prisão na China. Discussões sobre gênero também podem ser censuradas na internet. Essa aqui é a introdução da jornalista @SoniaBridi, que foi correspondente em Pequim, para o livro “Enfrentando o dragão”.
5-A violência contra as mulheres é uma prática generalizada na China. A primeira lei que visa especificamente proteger as vítimas de agressão doméstica só foi aprovada em 2015, após 66 anos de regime. Até então, bater na esposa era uma prática legal.
https://www.theguardian.com/world/2015/dec/27/china-passes-first-domestic-violence-law
6-É professora? Em 2016, Pequim saiu em busca de professores homens para substituir as mulheres e reafirmar a masculinidade nas escolas. De acordo com a imprensa estatal, “as escolas precisam de uma masculinidade selvagem”.
7-Sabe o “meu corpo, minhas regras”? Não existe na China. Por lá, leis regulam para que a tv não retrate decotes e transas de uma noite, considerados “pornografia e gosto barato”, assim como “homossexualidade”, “casos extraconjugais” e “liberdade sexual”.
http://www.xinhuanet.com/zgjx/2017-07/01/c_136409024.htm
8-Cantoras como Katy Perry, Beyoncé, Britney Spears e Lady Gaga – ícones da cultura progressista ocidental – foram censuradas na China com a desculpa de que são “vulgares”.
https://www.theguardian.com/world/2011/aug/24/banned-china-lady-gaga-perry
9-O hip hop – outro instrumento importante do progressismo na cultura ocidental – sofre censura oficial na China, tratado como “subcultura” e “imoral”.
https://www.reuters.com/article/us-china-censorship-hiphop-idUSKBN1FB139
10-Quer protestar contra tudo isso na internet? Pequim produz a maior censura virtual do planeta, bloqueando 10 mil domínios estrangeiros, incluindo os maiores grupos de direitos humanos do mundo. Não há acesso ao Twitter, Facebook, Instagram ou Youtube.
11-Não gosta de nações com vocação imperialista, se envolvendo nos assuntos domésticos de outros países? É o que a China é acusada nas Filipinas, no Vietnã, na Malásia, na Tailândia, no Camboja, na Índia, no Tibete, na Austrália…
12-Gosta de igualdade social? A China é quase tão desigual quanto os EUA. E quem diz isso não sou eu: é Thomas Piketty. O último livro dele, “Capital e Ideologia”, lançado em 2019 com duras críticas à desigualdade chinesa, foi censurado na China.
13-Defende o direito dos presos? A China foi condenada por um tribunal internacional por promover a extração à força de órgãos de presos – alguns ainda vivos – para vender num mercado negro de transplantes que movimenta US$ 1 bilhão por ano no país.
14-As autoridades chinesas matam mais prisioneiros todos os anos do que o resto do mundo somado.
https://bbc.com/news/world-asia-china-30324440
Há anos o país promete interromper a prática de extrair órgãos de seus presos executados. Nada indica que tenha parado.
15-É religioso? O governo chinês vê a liberdade de crença com maus olhos. Quando a atriz Ning Jing visitou Dubai no reality show “Divas Hit The Road”, por exemplo, a censura oficial chegou a substituir seu lenço religioso, tradição islâmica, por isso aqui:
16-A ONU diz que seus relatórios confirmam a existência de campos de concentração para muçulmanos em Xinjiang, e chama a região de “zona sem direitos”. Xinjiang é o palco da maior política de discriminação racial no mundo desde o fim do Terceiro Reich.
https://www.reuters.com/article/us-china-rights-un-idUSKBN1KV1SU
17-É cristão? Milhares de igrejas são destruídas todos os anos na China. Nas que sobram, imagens sacras podem ser substituídas por fotografias de Xi Jinping.
https://wsj.com/articles/beijings-collision-with-christians-11608593160…
Padres e pastores são presos por simplesmente evangelizar.
18-Há pouco tempo, Pequim reuniu um grupo de estudiosos para “traduzir” a Bíblia, com o objetivo de criar uma nova versão do cristianismo e eliminar passagens consideradas incompatíveis com o partido.
https://www.wsj.com/articles/the-gospel-according-to-xi-11591310956
19- Uma mudança é no episódio em que Jesus poupa Maria Madalena de apedrejamento. Num livro de uma universidade estatal, Jesus a apedreja, dizendo: “Eu também sou um pecador. Mas se a lei só pudesse ser executada por homens sem mancha, a lei estaria morta.”
https://www.wsj.com/articles/the-gospel-according-to-xi-11591310956
20-O governo chinês também é acusado de coagir “centenas de milhares de tibetanos” a “campos de trabalho forçado”. Jornalistas estrangeiros não têm permissão para entrar na região, que também é palco de violência estatal étnico-religiosa.
https://www.bbc.com/news/world-asia-china-54260732
21-Há nesse momento ainda uma luta para erradicar a cultura dos mongóis, no norte da China. O objetivo oficial é a “promoção da unidade étnica”. Pequim é acusada de praticar “genocídio cultural” na Mongólia Interior.
22-Se o racismo contra negros gera revolta no Ocidente, na China ele é generalizado. No programa de intercâmbio que conecta alunos chineses a escolas dos EUA, a maioria dos candidatos solicita que seus filhos não sejam enviados para casas de famílias negras.
https://thediplomat.com/2020/04/racism-is-alive-and-well-in-china/
Militantes negros são perseguidos pela polícia chinesa depois que escrevem sobre racismo na internet.
https://buzzfeednews.com/article/lesterfeder/china-racism-africa-coronavirus…
Há uma longa história de discriminação contra negros na China – sem debate público, cobertura da imprensa ou manifestações.
23-Em 2020, inúmeros casos de negros impedidos de entrar em lojas, hotéis e hospitais foram registrados na China.
https://edition.cnn.com/2020/05/25/asia/china-anti-african-attacks-history-hnk-intl/index.html…
Incluindo placas proibindo a entrada de negros no McDonalds.
24-Blackface é comum na tv estatal chinesa.
https://bbc.com/news/world-asia-china-43081218…
Em 2016, na propaganda chinesa de um sabão em pó, um ator negro foi “higienizado” para virar chinês.
Em 2017, um museu no país chegou a comparar negros com macacos.
25-Em 2020, diferentes diplomatas africanos protestaram contra o racismo na China. Governos de diversos países – como Nigéria, Gana, Quênia e Uganda – convocaram embaixadores chineses para receber protestos formais sobre os incidentes de racismo no país.
26-E isso pra não falar de quem milita por direitos trabalhistas. A China é famosa por seu “sistema 996”, que prevê 12 horas de trabalho por dia, seis dias por semana.
27-É irônico que um governo que diz falar em nome dos “proletários” comande um país tão abertamente reconhecido no mundo pela exploração da mão de obra barata de seus operários, com muitos trabalhadores em “fábricas de suor”, sem proteção estatal.
28-E há ainda as condições de escravidão.
https://bbc.com/portuguese/internacional-55367199…
Como publica o Guardian: “A escravidão nunca será história enquanto fecharmos os olhos para a China”.
Para muitos, sobram preocupações com a escravidão do passado, falta para a do presente.
29-E se você está pensando que tudo isso não passa de propaganda dos EUA e da direita reacionária, não entendeu nada. Na ONU, os abusos aos direitos humanos na China são condenados dos sociais democratas da Suécia aos trabalhistas da Nova Zelândia.
https://www.hrw.org/news/2020/10/06/39-countries-un-express-grave-concerns-about-chinas-abuses
30-Em 2020, as democracias que melhor protegem os direitos humanos no mundo condenaram a China na ONU. Entre outros: Alemanha, Austrália, Canadá, Dinamarca, Finlândia, França, Holanda, Noruega, Suíça. Do governo do Partido Socialista Operário Espanhol à Esquerda Verde da Islândia.
31-Mais de 300 grupos de direitos humanos – da Anistia Internacional à Human Rights Watch – de mais de 60 países – do Azerbaijão à Malásia – também pressionaram a ONU em 2020 para enfrentar com rigor as violações dos direitos humanos do governo chinês.
31-Os chineses dão de ombros e usam uma expressão depreciativa para ridicularizar os progressistas: Bái zuǒ (白左; “esquerda branca”). Para muitos chineses, a esquerda ocidental busca apenas “satisfazer seu próprio sentimento de superioridade moral”.
32-E apesar disso tudo, sobram progressistas por aqui dispostos a tomar as dores de uma ditadura que persegue LGBTs, feministas e minorias étnicas, impede protestos, explora presos e operários, censura arte e ONGS de direitos humanos, enquanto ridiculariza os próprios progressistas.
33-A razão? Comportamento de manada, ignorância crônica, maior compromisso com grupos do que com ideias, dissonância cognitiva, falta de independência, despeito com a democracia e os direitos humanos. Fingem abraçar o progresso. Estão engajados em promover a barbárie.