A atual composição do supremo tribunal federal vem aplicando tantas decisões polêmicas e equivocadas, todas de alto impacto, que os professores de Direito estão com dificuldade para organizar suas aulas de processo penal. Tudo aquilo que não é permitido aos juízes, contraditoriamente vem sendo praticado livremente por alguns ministros da corte, ainda que a legislação não haja estabelecido os procedimentos listados mais abaixo.

A lista de “novidades hermenêuticas” é tão extensa que tomei a liberdade de publicar aqui os respectivos itens, os quais foram organizados pelo professor Rodrigo Régnier Chemim Guimarães e publicados no facebook em 20/05/2021 e atualizados em 28/05/2021, 18/06/2021 e outras datas assinaladas no corpo do texto.
1. Juiz pode instaurar inquérito? Não, salvo se for ministro do STF;
2. Juiz pode investigar crimes? Não, salvo se for ministro do STF;
3. Juiz que se considera vítima de crime pode conduzir investigação a respeito? Não, salvo se for ministro do STF;
4. Juiz pode determinar busca e apreensão sem representação do delegado ou do Ministério Público? Não, salvo se for ministro do STF;
5. Juiz pode manter prisão em flagrante sem convertê-la em preventiva? Não, salvo se for ministro do STF;
6. Juiz pode determinar prisão em flagrante de alguém por crime instantâneo, acontecido dias atrás, ao argumento, claramente errado, de que o crime seria permanente, confundindo dado básico de direito penal que diferencia crime permanente de crime instantâneo com efeitos permanentes? Não, salvo se for ministro do STF;
7. Juiz pode dar continuidade à investigação quando o Procurador-geral determina o arquivamento do inquérito? Não, salvo se for ministro do STF;
8. Juiz pode dar entrevista sobre o caso que vai julgar emitindo opinião antecipada sobre o mérito do caso? Não, salvo se for ministro do STF;
9. Juiz pode ofender graciosamente a honra dos interessados no processo, externalizando um misto de sentimento de ódio, raiva e inimizade pessoal, tanto no curso do processo, quanto em entrevistas e palestras, repetidas vezes, e seguir se considerando imparcial para analisar o caso? Não, salvo se for ministro do STF;
10. Juiz pode fazer homenagem pública ao advogado do réu, elogiando seu trabalho no caso concreto a ponto de chegar às lágrimas de tão abalado emocionalmente que ficou, revelando uma torcida pela defesa e se considerar ao mesmo tempo imparcial para julgar o caso? Não, salvo se for ministro do STF;
11. Juiz pode considerar válido inquérito sem fato delimitado para investigação? Não, salvo se for ministro do STF;
12. Juiz pode fazer analogia “in malam partem”, alargando o objeto material de um crime por interpretação? Não, salvo se for ministro do STF;
13. Juiz pode dizer ao investigado que ele tem direito ao silêncio, mas caso resolva falar não pode mentir? Não, salvo se for ministro do STF;
14. Juiz pode decidir considerar nula delação premiada que delatava a ele mesmo? Não, salvo se for ministro do STF. Cada dia uma novidade nesse novo processo penal brasileiro;
15. Juiz pode determinar a condução coercitiva de investigado em procedimento criminal? Não, desde a decisão do Pleno do Supremo Tribunal Federal, de 2018, “sob pena de responsabilidade disciplinar, civil e penal do agente ou da autoridade e de ilicitude das provas obtidas”, salvo se for ministro do STF. Atualização de Rodrigo no face em 18/06/2021;
Mais uma decisão monocrática que contraria a posição firmada pelo Pleno do STF. Em 14 de junho de 2018, o Pleno do STF, julgando a ADPF 395, decidiu: “A legislação prevê o direito de ausência do investigado ou acusado ao interrogatório. O direito de ausência, por sua vez, afasta a possibilidade de condução coercitiva.”
Agora, três anos e meio depois, mesmo anotando que o investigado peticionou no sentido de que “declina da oitiva pessoal que lhe foi oportunizada pela autoridade policial”, o Ministro Alexandre de Morais decidiu, no caso de investigação contra Bolsonaro, que, “não tendo o Presidente da República indicado local, dia e horário para a realização de seu interrogatório no prazo fixado de 60 (sessenta) dias, DETERMINO SUA INTIMAÇÃO, por intermédio da AGU (conforme solicitado no item “V-v” de sua petição), para que compareça no dia 28/1/2022, às 14h00, PARA PRESTAR DEPOIMENTO PESSOAL, na sede da Superintendência Regional da Polícia Federal no Distrito Federal”. A insegurança jurídica é uma marca da Suprema Corte ultimamente. Difícil ensinar Direito hoje em dia…Atualizado no face por Rodrigo em 27/01/2022;
16. Juiz pode determinar o bloqueio de aplicativos de conversação com alcance nacional? De acordo com a última decisão do STF, não. Salvo, se for ministro do STF. Atualização de Rodrigo no face em 19/03/2022;
17. Juiz pode arbitrar multa por descumprimento de ordem judicial e, ao mesmo tempo, determinar instauração de inquérito por crime de desobediência? De acordo com o STF e o STJ, não, salvo se for ministro do STF. Atualização de Rodrigo no face em 31/03/2022.